Aspectos polêmicos da nova Lei nº 14.151/2021 – O trabalho remoto obrigatório para gestantes na pandemia e a Convenção 103 da OIT

Em 12/05/2021, foi publicada a Lei nº 14.151/2021 que determina o afastamento da empregada gestante das atividades laborais presenciais, durante o período da pandemia, devendo ser mantido o pagamento da sua remuneração. A regra se estende, também, para as empregadas domésticas. Para os trabalhos intelectuais ou que possam ser desempenhados, não há grandes discussões, na medida em que a referida Lei autoriza o teletrabalho ou trabalho remoto.

No entanto, no nosso entendimento, da forma como foi promulgada, a Lei acarreta ônus excessivo para o empregador nos casos em que as atividades laborais devem ser, necessariamente, desempenhadas no estabelecimento do empregador ou do tomador de serviços, em razão da natureza dos serviços, como é o caso de algumas empresas prestadoras de serviços terceirizados com internalização de mão de obra.

Isso porque, o artigo 1º da mesma Lei veda o trabalho presencial de gestantes, sem prejuízo do seu salário. Ato contínuo, o parágrafo único apenas faculta aos empregadores exigirem o trabalho de forma remota, sem dar alternativas.

Na impossibilidade de teletrabalho, nota-se que o empregador não teria opção senão efetuar o pagamento do “salário” sem a respectiva prestação dos serviços, o que pode ter efeitos nocivos para mercado de trabalho e com aumento dos fatores de discriminação do trabalho feminino.

Se a natureza do serviço presencial inviabiliza o trabalho remoto, precisamos buscar alternativas. É a hipótese, por exemplo, da suspensão do contrato de trabalho prevista pela Medida Provisória nº 1.045/2021 cujo prazo, contudo, fica limitado até 25/08/2021.

Outro ponto igualmente importante é analisar o valor da remuneração da empregada gestante durante a suspensão do contrato de trabalho, já que, se for inferior ao salário devido, poderá ensejar discussões judiciais com a condenação das empresas.

É possível, também, cogitar a antecipação das férias e feriados, bem como a adoção de banco de horas, todos autorizados pela Medida Provisória nº 1.046/2021, para as empregadas impossibilitadas de realizar suas atividades de forma remota.

Entretanto, tais medidas, diante da limitação temporal, têm caráter apenas paliativo, já que o período de gestação, dependendo do estágio da gravidez, ultrapassará os prazos autorizados pelas Medidas Provisórias nº 1.045 e 1.046/2021.

Ao nosso ver, andou mal o Congresso e o Poder Executivo, pois não regulamentaram adequadamente a questão, que poderia até ser equiparada às situações de gravidez de risco – por analogia ao artigo 394-A, §3º, da CLT – com a consequente percepção de salário-maternidade durante todo o período de afastamento às expensas do INSS.

Em resumo, a Lei nº 14.151/2021 buscou, bem intencionadamente, proteger a empregada gestante e o nascituro neste momento sensível de pandemia. Contudo, as medidas legais e isoladas de “proteção” sem uma visão sistêmica podem gerar um efeito contrário ao esperado, pois servem para reforçar as desigualdades, os preconceitos e a discriminação contra o trabalho das mulheres.

Há muitas questões a serem respondidas sobre a Lei nº 14.151/2021, mas a principal delas é onde está a fonte de custeio para a nova forma de “salário maternidade” criada e se o Estado pode transferir este ônus aos empregadores, ao arrepio das normas internacionais e ao item 8 do art. 4º da Convenção 103 da OIT[1].

[1] 8. Em hipótese alguma, deve o empregador ser tido como pessoalmente responsável pelo custo das prestações devidas às mulheres que ele emprega.